Vilões no cinema fascinam por sua complexidade, função narrativa e reflexo social. Entenda por que o público simpatiza com personagens como Loki, Coringa e Killmonger.
Vilões ocupam cada vez mais espaço nas telas, não apenas como antagonistas, mas como personagens centrais em filmes e séries. Obras como Coringa e Cruella revelam esse movimento crescente que ultrapassa a simples oposição entre bem e mal.
A figura do vilão passou a ser moldada por complexidade psicológica, dilemas morais e contextos sociais, tornando-se um espelho das inquietações contemporâneas.
O poder de se identificar com o mal
A curiosidade sobre a mente de figuras perturbadoras, muitas vezes inspiradas em criminosos reais, encontra na ficção um ambiente seguro para investigar comportamentos extremos.
O público busca compreensão, não necessariamente justificativa, para aquilo que desafia as normas morais. Essa aproximação não é literal, mas se baseia na atração pelo complexo e pelo ambíguo.
Esse envolvimento é intensificado quando o espectador reconhece nos vilões características semelhantes às suas. Sentimentos como ambição, raiva, rejeição ou ressentimento tornam essas figuras mais próximas da realidade. Essa identificação parcial não implica concordância com os atos, mas revela um reconhecimento de fragilidades humanas.
É o que acontece com personagens como Killmonger, de Pantera Negra, que apesar dos métodos violentos, levanta debates legítimos sobre desigualdade e memória histórica.

Crédito: Divulgação / Marvel Studios
Outro fator é a simpatia paradoxal. Alguns vilões conquistam o público por apresentarem motivações compreensíveis, traumas profundos ou até mesmo uma causa distorcida, mas emocionalmente relevante.

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Exemplos incluem Loki em Thor, Magneto em X-Men, Darth Vader em Star Wars, e Hal 9000 em 2001: Uma Odisseia no Espaço. Esses personagens despertam empatia mesmo quando suas ações são condenáveis.
Há ainda casos em que o vilão se torna amado por sua irredimibilidade. O Coringa, em suas diferentes versões, é um dos maiores símbolos disso. Ao invés de uma busca por redenção, sua força está no caos, na subversão da ordem e na forma como canaliza as falhas de uma sociedade. Azula, da animação Avatar: A Lenda de Aang, também é lembrada pela ausência total de traços heroicos, o que a torna ainda mais marcante.
Vilões como motores da narrativa
Na construção de uma boa história, os vilões exercem a função de impulsionar o enredo e provocar transformações profundas nos protagonistas. Eles são catalisadores de conflito e desenvolvimento emocional. Um herói se torna mais interessante quando precisa enfrentar um inimigo à altura.
O impacto narrativo de um vilão está diretamente ligado à sua profundidade psicológica. Em vez de serem retratados apenas como figuras malignas, muitos são apresentados com histórias trágicas, motivações fortes e traços humanos. Esse recurso é potencializado quando a narrativa adota a perspectiva do vilão, como em Malévola e Cruella, onde o público acompanha seus dilemas de perto e compreende suas razões.

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Essa abordagem reforça o papel dos vilões como elementos estruturais essenciais. Sem eles, muitas narrativas perderiam a tensão dramática, o crescimento dos heróis e os dilemas morais que prendem a atenção do público.
Um espelho da sociedade
A forma como os vilões são retratados reflete o contexto social e político de cada época. Durante a Guerra Fria, por exemplo, predominavam antagonistas associados a potências estrangeiras e ao comunismo. No século XXI, vilões como Thanos e Killmonger passaram a incorporar temas como crise ambiental, desigualdade racial e revolta contra o sistema.
Essa evolução narrativa acompanha uma mudança de percepção social. A audiência busca personagens que não representem apenas o mal absoluto, mas que levantem questões éticas e reflexões sobre a condição humana. A presença de vilões mais realistas e contextualizados responde a essa demanda por tramas que provoquem debates contemporâneos.
Em contrapartida, algumas representações ainda perpetuam estereótipos negativos, como a associação entre deficiência física e maldade, visível em personagens como o Corcunda de Notre Dame ou Capitão Gancho. Essa ligação entre deformidade e vilania reforça preconceitos e exige uma abordagem mais crítica por parte de roteiristas e produtores.
O vilão também serve como metáfora dos vícios humanos. Personagens como o Coringa revelam o que acontece quando impulsos destrutivos são liberados sem controle.

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A luta entre heróis e vilões espelha os conflitos morais internos de cada espectador, desafiando a noção de que o bem e o mal estão separados por uma linha clara.
Artigo escrito por Kaique Barbosa dos Passos – sob a supervisão de Robson Netto.